segunda-feira, 20 de março de 2023

CONTO 23: "A formiga e a neve"

A FORMIGA E A NEVE 

(Coletado por Sílvio Romero em Sergipe)

UMA VEZ UMA FORMIGA FOI  ao campo e ficou presa num pouco de neve. Então ela disse à neve: “Ó neve, tu és tão valente que o meu pé prendes?” A neve respondeu: “Eu sou valente, mas o sol me derrete.” Ela foi ao sol e disse: “Ó sol, tu és tão valente que derretes a neve, a neve que meu pé prende?” O sol respondeu: “Eu sou valente, mas a nuvem me esconde.” Ela foi à nuvem e disse: “Ó nuvem, tu és tão valente que escondes o sol, o sol que derrete a neve, a neve que meu pé prende?” A nuvem respondeu: “Eu sou valente, mas o vento me des- mancha.” Ela foi ao vento: “Ó vento, tu és tão valente que desmanchas a nuvem, a nuvem que cobre o sol, o sol que derrete a neve, a neve que meu pé prende?”

 — “Sou valente, mas a parede me faz parar.” Vai à parede: “Ó parede, tu és tão valente que paras o vento, o vento que desmancha a nuvem, a nuvem que esconde o sol, o sol que derrete a neve, a neve que meu pé prende?”

— “Sou valente mas o rato me fura.” Foi ao rato: “Ó rato, tu és tão valente que furas a parede, a parede que para o vento, o vento que desmancha a nuvem, a nuvem que esconde o sol, o sol que derrete a neve, a neve que meu pé prende?” — “Sou valente, mas o gato me come.” Vai ao gato: “Ó gato, tu és tão valente que comes o rato, o rato que fura a parede, a parede que para o vento, o vento que desmancha a nuvem, a nuvem que esconde o sol, o sol que derrete a neve, a neve que meu pé prende?”

— “Sou valente, mas o cachorro me bate.” Vai ao cachorro: “Tu és tão valente que bates no gato, que come o rato, que fura a parede, que para o vento, que desmancha a nuvem, que esconde o sol, que derrete a neve que meu pé prende?”

—“Sou valente, mas a onça me devora.” Vai à onça: “Tu és tão valente que devoras o cachorro, que bate no gato, que come o rato, que fura a parede, que para o vento, que desmancha a nuvem, que esconde o sol, que derrete a neve que meu pé prende?”

— “Eu sou valente, mas o homem me mata.” Vai ao homem: “Ó homem, tu és tão valente que matas a onça, que devora o cachorro, que bate no gato, que come o rato, que fura a parede, que para o vento, que desmancha a nuvem, que esconde o sol, que derrete a neve que meu pé prende?”

— “Eu sou valente, mas Deus me acaba.” Foi a Deus: “Ó Deus, tu és tão valente que acabas o homem, que mata a onça, que devora o cachorro, que bate no gato, que come o rato, que fura a parede, que para o vento, que desmancha a nuvem, que esconde o sol, que derrete a neve que meu pé prende?” Deus respondeu: “Formiga, vai furtar.” Por isso é que a formiga vive sempre ativa e furtando.

Disponível em:  CONTOS POPULARES DO BRASIL Sílvio Romero coleção acervo brasileiro cadernos do mundo inteiro Coleção acervo brasileiro Volume 3, 2017, Jundiaí, SP.


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